sexta-feira, 30 de março de 2018

Meus olhos primavera


Arte de Christian Schloe

Sacrílego, o gesto de antecipação
da cor, no tempo da gestação.
Feminino e vibrante, o pulsar
no resguardo da chuva precisada.
Arrepio da palavra de vento fustigada.
No teu ventre, útero imenso,
germinando colos de alvorada,
ainda dormem os fetos e as cores
que cobrirão os dias da terra.

E eu, sentada, escrevo versos pacientes.
A exaltação tem hora marcada. Anuncia-se
de verde. Serão, então, meus olhos primavera.
Odete Costa Ferreira, 14-03-18

Março fez-se no feminino: mulher, palavras, poesia...




Em Montalegre, Biblioteca Municipal




No IEFP, Chaves, colóquio: "Das palavras ao poema"



Na Maia, 24-03: apresentação da Antologia Poesia Portuguesa 2013-2018 (coautoria)

Desejando uma harmoniosa quadra pascal, deixo-vos a última estrofe de um poema:

"Veneranda, a arca do teu pão,
alimento do corpo e migração espiritual,
chega-me intacta.
Recebe, das minhas mãos, o teu crucifixo,
da tua boa, redenção.
E é Páscoa. Em nós." 
Odete Costa Ferreira, 28-03

quinta-feira, 8 de março de 2018

A vida que te é (de)vida


Obra de Brooke Shaden, We are Infinite

Se te souberem dizer em que tempo,
em que lugar, ou em que ato
te soubeste culpada,
é porque de sanidade
ficou órfã a humanidade.

Pertencerá à terra, a honra do teu legado.
Pertencerá ao pó das sementeiras primaveris
e dos ventos de feição a exortação da
tua palavra, do verbo primeiro, do sentido
dos cabelos destrançados nos braços da criação.

Será dos enxertos necessários,
o ensejo da renovação da seiva,
da decantação do sangue,
da libertação das palavras
- que fendem os teus direitos, mulher!

Se te disserem que nasceu um mundo novo,
silaba as palavras, solfeja os sons, sustem as raízes.
Pelos tempos, pelos espaços e, sobretudo,
pelos livros sagrados da tua religiosidade.
Firma-os em ato solene, com assinatura de poeta,
Numa caligrafia redonda, inquestionável à escuridão dos tempos.

Odete Costa Ferreira